O aumento da criminalidade é, muitas vezes, mais uma perceção do que o retrato fiel da realidade. No entanto, o sentimento de insegurança e a desinformação podem contribuir para que alguns moradores se sintam desconfortáveis ou que se propaguem ideias erradas sobre determinados bairros. Segundo o Superintendente Luís Elias, Comandante do Comando Metropolitano de Lisboa da PSP, existe “alguma estigmatização” associada a determinados bairros sociais que nem sempre é “justa”. “Há muitas zonas onde a criminalidade nem sequer é particularmente elevada. Noutras, pelo contrário, existem, de facto, alguns fenómenos de criminalidade, nomeadamente associados ao tráfico de estupefacientes”, explica. No âmbito da sua atuação, a PSP faz um “policiamento de proximidade”, em que procura desenvolver “uma atuação bastante próxima, quer das comunidades, quer dos estabelecimentos de ensino que servem essas comunidades”.
De acordo com o Superintendente Luís Elias, a PSP atua em “três níveis de proximidade”. Em primeiro lugar, procura “estabelecer ligações com os líderes comunitários locais”. “É uma dimensão bastante importante tentarmos identificar quem é que, do ponto de vista formal e informal, tem algum peso na comunidade, quer sejam associações locais, quer sejam clubes desportivos, quer sejam outro tipo de entidades que tenham alguma importância no bairro”, refere. Depois existem as dimensões da segurança pública e da investigação criminal. “Temos também a dimensão de segurança pública, isto é, a resolução de incidentes, quando eles acontecem, quer seja no âmbito da via pública, quer seja, por exemplo, num âmbito mais doméstico – e aqui entra a violência doméstica. E depois temos a dimensão da investigação criminal, que é no caso de haver crime efetivo, portanto, fenómenos associados à criminalidade, quer no âmbito do tráfico de estupefacientes, quer no âmbito dos crimes contra o património, como roubos, furtos, e não só. O inquérito dos crimes leva muitas vezes à realização de buscas domiciliárias e outras”, refere o Comandante do Comando Metropolitano de Lisboa da PSP.
Miguel Silva Pereira, administrador da Gebalis, assegura que “nos bairros vivem maioritariamente boas pessoas: gente que trabalha, jovens estudantes, pessoas que, na sua grande maioria, não são criminosos”. Por isso, também considera que “em determinados bairros a perceção de segurança não condiz com os números efetivos”. Ainda assim, a Gebalis faz também um “trabalho de proximidade” não só com “as associações locais” como com “a própria polícia, que está sempre presente nos grupos comunitários”.
Temos feito muito quanto às desocupações por via de ocupação ilegal e temos uma cooperação estratégica com a Polícia, porque, de facto, trata-se de um crime.
Estes grupos reúnem “diversos parceiros” como a PSP, a Polícia Municipal, associações locais ou grupos desportivos e – tal como explica o Superintendente Luís Elias – começa por existir “uma fase de diagnóstico” em que se tenta “perceber quais são os principais problemas, carências ou queixas que os cidadãos têm acerca do bairro, sejam elas a falta de iluminação pública, a falta de equipamentos sociais, danos ou destruição do património público, a inexistência de equipamentos desportivos ou equipamentos para as crianças e jovens brincarem.”. Além desta dimensão mais social e comunitária são também abordados “outros assuntos mais relacionados com as atribuições da Polícia de Segurança Pública, como os problemas criminais – sejam o tráfico de estupefacientes ou o consumo”. Apesar de o consumo “extravasar um pouco a dimensão da polícia”, muitas vezes, “está relacionado com o tráfico e as pessoas queixam-se de haver toxicodependentes a consumirem a céu aberto”. Em seguida, “são procuradas soluções”, que são, depois, partilhadas nestes grupos comunitários.
No âmbito do policiamento de proximidade, a PSP identifica também uma série de situações fora do âmbito da criminalidade que carecem de acompanhamento específico: “No âmbito do Programa Escola Segura e da sua ligação com as escolas, ao nível local, são detetadas situações como, por exemplo, carências alimentares de crianças que vão de manhã para a escola e não tomaram o pequeno-almoço ou que reiteradamente não são alimentadas ou não têm os cuidados básicos de higiene ou de saúde.” Segundo o Comandante do Comando Metropolitano de Lisboa da PSP, “outra dimensão muito importante” é o facto de existirem “muitos idosos a viver em situações de grande solidão em muitas destas zonas residenciais”. Nestes casos, a função da PSP passa por “sinalizar estas situações” e encaminhá-las para as “instâncias próprias”. Miguel Silva Pereira acredita que a resposta para a construção de um ambiente mais seguro nos bairros municipais passa pelo “envolvimento” de todos “desde a junta de freguesia, o município, a Polícia Municipal, os grupos comunitários ou as associações de cada bairro”. Por isso, nestes grupos comunitários, procuram “dar voz aos moradores e às figuras intervenientes nos bairros, como os líderes das associações” ou, em alguns bairros mais específicos, “uma ou outra família que tenha um pouco mais de peso ou mesmo voz ativa no bairro”.

Luís Elias, Comandante do Comando Metropolitano de Lisboa da PSP
[Nos países escandinavos] os projetos que vão sendo aprovados têm de seguir determinado tipo de princípios no sentido de garantir um ambiente mais aprazível para os cidadãos. É sempre obrigatório haver espaços verdes, equipamentos desportivos ou equipamentos para as crianças.
Ocupação ilegal de casas “preocupa” Gebalis
Para que exista uma verdadeira articulaçãoentre forças de segurança, gestão habitacional e moradores é necessário “criar confiança entre todos estes intervenientes”.Na opinião do Superintendente Luís Elias,é determinante “os moradores destes bairros não verem na polícia um adversário,mas um parceiro”. Ao serem criados estes“laços de confiança”, gera-se uma “troca deinformações” importante para as forças desegurança e, em simultâneo, os moradores veem alguns “assuntos que foram debatidos a ser resolvidos”. A título de exemplo, Luís Elias refere que algumas das queixas dizem respeito “à ocupação de determinadas zonas do bairro por indivíduosque não são do bairro e que vão para obairro para a prática de ilícitos criminais” e“é importante que essa situação seja do conhecimento, por um lado, da Gebalis e, poroutro lado, das autoridades para a legalidade ser reposta”: “Este é um aspeto quecria um forte sentimento de impunidade, um sentimento de descontentamento por parte dos residentes nos bairros, ao verem que há tanta carência de habitação e há casas que são ocupadas ilegalmente, algumas das quais para o cometimento de atividades ilícitas”.
Miguel Silva Pereira assegura que a “cooperação estratégica” com a PSP “existiu desde sempre”, mas “tem evoluído muito ao longo destes últimos anos”. Quanto à ocupação ilegal das casas, admite que tem preocupado a Gebalis: “Temos feito muito quanto às desocupações por via de ocupação ilegal e temos uma cooperação estratégica com a Polícia, porque, de facto, trata-se de um crime. São situações que estão reiteradas de incumprimento e há muito tempo que prejudicam a imagem dos bairros e afetam a vida de quem lá mora e tem uma vida de trabalho.”
Melhoria do espaço público reduz a criminalidade
A requalificação do espaço público tambéminfluencia diretamente a segurança dosmoradores. Tal como explica o Comandante do Comando Metropolitano de Lisboa daPSP, há mesmo uma “relação direta” entrea melhoria do espaço público e a reduçãoda criminalidade explicada “ao nível das teorias da criminologia” e designada como “a prevenção criminal através do design ambiental”. “Em Portugal, defendo há muitos anos que, à semelhança de um parecer vinculativo da parte da Proteção Civil para determinado tipo de investimentos, também devia haver um parecer por parte das forças de segurança. Nomeadamente, nesta área dos bairros sociais, em que sabemos que há um conjunto de bairros que foi construído nos anos 1960, 1970, 1980 e a própria arquitetura, em alguns aspetos, não facilita a movimentação das polícias, por um lado, e dos próprios residentes quando se criam becos ou corredores muito estreitos”, afirma Luís Elias e prossegue: “Eu conheço muito bem alguns destes bairros e, tendencialmente, nos bairros onde existem alguns fenómenos criminais, há acumulação de pessoas em becos escuros, mal iluminados, onde é propositadamente destruída a luz… Também existem autênticos labirintos em alguns bairros que depois, no caso de haver uma intervenção policial, dificultam-na muito e criam também oportunidades para o crime.”
À semelhança do que acontece noutros países, o superintendente considera que Portugal podia “dar um passo um pouco maior neste sentido”: “Há alguns exemplos na Europa, por exemplo, nos países escandinavos, onde esta realidade é muito estudada e tem uma previsão concreta no enquadramento legal existente. Os projetos que vão sendo aprovados têm de seguir determinado tipo de princípios no sentido de garantir um ambiente mais aprazível para os cidadãos. É sempre obrigatório haver espaços verdes, equipamentos desportivos ou equipamentos para as crianças. E depois, na própria arquitetura e no desenho dos edifícios, não são permitidos determinado tipo de estruturas que, ou pela falta de manutenção que possa existir ou pela utilização indevida, possam ser propícias ao crime.”
Por sua vez, Miguel Silva Pereira admite que há bairros “com alguns anos que estiveram muito tempo sem intervenção” e, por isso, “têm zonas mal iluminadas, passagens inferiores e um conjunto de situações que podem ser propícias à prática de crimes e à diminuição da sensação de segurança”. No entanto, assegura que a Gebalis tem feito “muitas obras de requalificação”, nas quais procuram “diminuir e atenuar essas questões sempre de acordo com as regras urbanísticas”, o que – confessa – “muitas vezes não é fácil de conciliar”.
No que diz respeito à destruição do património que, muitas vezes, acontece através de atos de vandalismo, o Superintendente Luís Elias deixa uma sugestão: “Ter equipas de resposta rápida para, em casos de ocorrências de destruição e de vandalismo, a situação ser reposta e ser resolvida de imediato.”